QUE SERÁ, SERÁ!

Os mais velhos entre nos com certeza vão recordar esta canção imortalizada na voz da inesquecível Leny Eversong. O título e o texto desta canção poderia servir de tema musical para a novela vivida na atualidade pelo grande número de empresários calçadistas. Pelo comportamento de dejá vu que apresentam, com a mentalidade de “este filme já vi muitas vezes” demonstram, que não entendem as modificações que estão ocorrendo no mundo de calçados tanto global, como nacional.

Infelizmente, este filme está sendo projetado pela primeira vez, embora o enredo possa confundir com as crises pelas quais já passou, com menos ou mais perdas, a indústria nacional de calçados. Desta vez a crise é mais profunda e está baseada no deslocamento do eixo econômico do Ocidente para o Oriente.

Para um observador atento, não há como não observar os indícios de profundas mudanças tanto na produção como na comercialização de calçados. Na produção podemos ver as mudanças, que já foram detectadas pelo jornal “Comércio da Franca” em 17.05.2007 quando apontou as crescentes dificuldades para exportar. Infelizmente, a previsão do então presidente do Sindicato Jorge Felix Donadelli de acreditar que a desvalorização do dólar pode durar ao menos seis meses não se concretizou. O dólar continuou desvalorizado e não fossem as maciças compras do Banco Central, hoje estaria ao par com o Real, a recente oscilação no cambio não altera a dura realidade cambial.

Mas não é só o câmbio que amargou a vida dos nossos empresários. O comentário do prof. Daltro Oliveira Carvalho, publicado na edição de 23.03.2008 dá outra dimensão ao problema calçadista:  “Nestes últimos 20 anos, foram muito poucos os empresários que investiram em profissionalização e produção. A maioria decidiu, tarde demais, se preocupar com adaptação à nova realidade econômica, que exige mais eficiência e investimento. Estes, claro, não sobreviverão.”  E continua: “Em empresas familiares, como as de Franca, as modificações e a profissionalização são sempre mais complicadas.”

O jornal “Exclusivo” traz na sua edição de 28.08.2011 a notícia sobre o fechamento da unidade fabril da Paquetá em Sapiranga, seguindo o exemplo da Azaléia que fechou também a sua unidade faz alguns meses. A empresa Ramarim absorveu 400 funcionários, mas o destino dos restantes 800 ainda é incerto. O que deu nos gaúchos, outrora tão orgulhosos da sua indústria calçadista, dando lições sobre empreendedorismo Brasil afora e agora fechando as suas indústrias?

Paquetá já produz em Santiago de Los Caballeros na República Dominicana, o que caracteriza fuga do custo Brasil, com sua legislação trabalhista obsoleta e impostos extorsivos, quando comparados com outros países. Aliás, como a imprensa indiana noticiou, até a poderosa Vulcabrás já comprou uma fábrica na Índia para produzir cabedais em couro, com economia de 70%, para exportá-los para o Brasil.

Em março o presidente da Vulcabrás, disse em tom de ameaça, que se não houver proteção do governo, a empresa seria obrigada a procurar outros países para permanecer competitiva com os importados. Obviamente, o senhor Milton Cardoso cansou de esperar pelas providências do governo para dificultar as importações, porque ele mesmo confessou que os subsídios apresentados para esta ação estão dormindo numa gaveta em Brasília.

É, que Brasília ainda não esqueceu o susto que levou com alguns grãos de soja transgênica  alegadamente detectados pelo comprador, a China, que fez os navios graneleiros darem meia-volta no oceano, só porque houve uma queda acentuada na cotação da soja na Bolsa de Chicago e para os chineses um contrato é igual a uma Carta de Intenções.

E o que fazer se os “companheiros” chineses fizerem cara feia por causa dos calçados, confecções, móveis etc. e pararem de comprar soja do Brasil e comprarem dos Estados Unidos, ou parar de importar o minério da Vale e comprá-lo da Rio Tinto na Austrália? Pelo mesmo preço? Aí sim, aí teríamos a valorização do dólar às alturas, mas em compensação – nem é bom pensar! Mas ainda temos otimistas inconsequentes que esperam a salvação da indústria calçadista pelos decretos oriundos de Brasília!!!

Melhor seria planejar a vida com base nos exemplos da Itália, Espanha, Portugal e até Inglaterra e Alemanha, onde a despeito de tudo os produtores de calçados estão sobrevivendo. Como? Descobrindo nichos de mercado, alta especialização, criatividade e um atendimento condizente com o terceiro milênio.

Esta é a receita de sobrevivência para a indústria nacional. Uma produção racional, onde antigamente se planejava em dias, será planejado em horas. Uma criatividade antenada às últimas tendências da moda, com antevisão naquilo que desponta no horizonte, mas ainda não se materializou. Será materializado por nossa ação. Atendimento de primeiro mundo, que começará pela voz modulada da telefonista e terminará em reposição via Sedex, para pedidos que vêm no mesmo dia pelo e-mail. Pelas visitas semanais dos nossos vendedores em contato permanente com as necessidades do mercado e dos nossos compradores.

Soa revolucionário? Sim, mas essa é a revolução em andamento e ai de quem não perceber as mudanças que estão ocorrendo, talvez, imperceptivelmente para muitos, mas presentes para quem observa e analisa. - As mudanças mais difíceis de serem executadas são as que envolvem a mentalidade dos empresários, prisioneiros da tradição e dos problemas do dia-a-dia, que não lhes dão a minima chance de ver e observar com a tranquilidade necessária para orientar e re-orientar o rumo das empresas deles.

Não fosse a enorme responsabilidade social (da qual poucos empresários se dão conta) com as pessoas que confiaram a sua vida e o seu bem estar nas mãos deles, acreditando, que estão sendo conduzidas para um futuro seguro, dentro de empresas sólidas, pouco poderia importar o desfecho desta novela. “Que será, será” na sua versão original é uma canção um pouco fatalista. Mas este fatalismo não se coaduna com a vida empresarial e com a dinâmica da vida moderna.

Vamos reagir para sobreviver ao tsunami que já vem da China e logo virá da Índia e da Indonésia sem falar de outros menores, mas não menos famintos? Para não repetir a famosa frase num túmulo de um cemitério inglês: “Eu não lhes dizia que estava doente?”

Zdenek Pracuch
19/09/11